A urbanização continuará a ser a força motriz do crescimento global. Contudo, dado o ritmo da urbanização, este processo requer planejamento, gestão e governança eficazes para que a urbanização reflita em um processo verdadeiramente transformador. Essa afirmação, revestida de alerta, é um dos destaques da última edição do Relatório Mundial das Cidades publicado pela ONU-Habitat em 2020. E baseia-se em dados alarmantes da própria ONU: a população mundial deve crescer em 2 bilhões de pessoas nos próximos 30 anos, passando dos atuais 7,7 bilhões de indivíduos para 9,7 bilhões em 2050; e a proporção da população mundial que vive em áreas urbanas deverá passar dos atuais 55% para 70% no mesmo período.
Neste contexto, cidades estariam tendo que assumir papeis mais ativos ao contribuir com as iniciativas de governos nacionais para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, ODSs. Entre os 17 objetivos estabelecidos para a Agenda 2030 no Brasil está o de Cidades e Comunidades Sustentáveis, que estipula metas com vias a torná-las mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis.
O planejamento urbano eficiente revela-se fundamental neste processo, para garantir que a urbanização seja sustentável e inclusiva, estimulando a densidade equilibrada ao mesmo tempo em que evita a superlotação. As áreas urbanas são locais heterogêneos, onde vivem grupos diversos de pessoas, e precisam – cada vez mais – atenderem às necessidades específicas de cada grupo, a fim de que “não deixam ninguém para trás”, como destaca o relatório da ONU.
Nesses grupos, especial atenção aos idosos, considerando que essa fatia da população está crescendo em ritmo acelerado. Até 2050, uma em cada seis pessoas no mundo terá mais de 65 anos (16%) — um aumento na comparação com a taxa de uma em cada 11 (9%) em 2019 — e o número de pessoas com 80 anos ou mais deverá triplicar, passando de 143 milhões em 2019 para 426 milhões, segundo dados da ONU.
O Relatório Mundial das Cidades da ONU apresenta pontos importantes sobre o papel das cidades neste processo de urbanização considerando o atual cenário. Confira:
- Políticas desenvolvidas internacionalmente, como a agenda de desenvolvimento global, podem orientar este processo, mas devem ser adaptadas ao contexto local a fim de assegurar a coerência política. As perspectivas dos governos locais devem ser integradas nas discussões internacionais, dado o seu papel na implementação de tais agendas;
- O valor da urbanização realiza-se quando as cidades respondem às necessidades específicas de cada um destes grupos, pois cada grupo encontra um tipo diferente de valor na cidade, que por vezes estão em desacordo e por vezes em harmonia;
- As cidades são largamente vulneráveis em relação à forma como as pessoas vivem, trabalham e se deslocam dentro delas e à sua volta. A densidade contribuiu para o atendimento mais eficiente a esses grupos; porém, a densidade não planejada pode provocar a superlotação;
- A saúde deve tornar-se um novo princípio orientador no planejamento e governança urbana. A pandemia de covid-19 estimulou inovações nas cidades em meio a um desejo de mais espaço público ao ar livre, como o fechamento de ruas a carros para permitir mais espaço de convivência para as pessoas e para andarem a pé e de bicicleta.
- O crescimento econômico e o potencial de consumo das cidades devem apoiar o desenvolvimento sustentável e construir resiliência às alterações climáticas;
- Os benefícios ambientais da urbanização dependem da forma como as cidades são planejadas e geridas;
- Para que o valor social da urbanização sustentável seja plenamente realizado, é preciso passar da busca pela “igualdade” para a da “equidade”;
- As cidades devem ser proativas na tecnologia que adquirem para uso público. Devem também estar dispostas a adotar uma abordagem reguladora para tecnologias disruptivas.
- As tecnologias disruptivas e novas formas de gestão das cidades são fundamentais para a experiência urbana. Estão a remodelar as relações sociais, os mercados de trabalho e a governança, mas não podem afastar o envolvimento dos cidadãos nos assuntos dos bairros e das cidades. A tecnologia é mais eficaz quando associada à inovação institucional, e não é um substituto à melhoria da governança, do planejamento, das operações e da gestão.
- As verdadeiras cidades inteligentes são orientadas para as pessoas: os cidadãos são o maior recurso das cidades, pois fornecem novas ideias para a inovação, atuam como os olhos ou ouvidos da cidade, ajudam a monitorar as condições no terreno e envolvem mais ativamente a cidade na definição de prioridades. As iniciativas de base tecnológica da cidade inteligente precisam de ser centradas nas pessoas e orientadas para as pessoas.